PICICA: "É público e notório o risco de retrocesso histórico na política
pública internacionalmente reconhecida e elogiada, vez que esta não se
reduz à nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho, pois acima dele, no
cargo de diretor do Departamento de Ações Programáticas e
Estratégicas/DAPES, também foi nomeado o médico psiquiatra Sr. Maurício
Viana, com experiência manicomial na Colônia Juliano Moreira (RJ). Acima
deste, encontra-se Alberto Beltrame, da Secretaria de Atenção à
Saúde/SAS, dono de comunidade terapêutica no Rio Grande do Sul e próximo
do Dep. Osmar Terra, relator do PL n. 7663/2010, que pretende facilitar
o financiamento desses simulacros de manicômio, que vão na contramão
dos princípios da Reforma Psiquiátrica brasileira, quais sejam: o
cuidado em liberdade, autonomia e garantia dos direitos humanos. O
quadro hierárquico se completa com a trajetória do próprio ministro da
Saúde, médico psiquiatra afastado das funções profissionais desde a
década de 80, que, mesmo durante seus 7 mandatos parlamentares, não
produziu nenhuma ação relevante no processo histórico da Reforma
Psiquiátrica brasileira, como é de conhecimento público. Em coerência
com a sua trajetória, vale destacar que na audiência do dia 10 de
dezembro, o ministro afirmou que o Hospital Psiquiátrico é a resposta
para o cuidado de pessoas com transtorno mental, o que é incompatível
com a Política Nacional de Saúde Mental, desde 2001. Para nossa
surpresa, na audiência do dia 29 de dezembro, chegou a afirmar nunca ter
lido uma Portaria ministerial sobre a mesma Política. Com essas
afirmações, fica clara a posição política do ministro da Saúde
desvinculada da Política Nacional de Saúde Mental, o que se concretiza,
de início, pela nomeação equivocada de Valencius Wurch e anuncia o risco
ao qual nos referimos."
EM TEMPO: Enquanto isso, Dilma Rousseff permanece impassível, e assim deverá permanecer, tal é o desmonte de políticas públicas que se acumulam ao seu redor. Lástima!
Excelentíssima Sra. Dilma Vana Roussef,
Presidenta da República Federativa do Brasil
A Associação Brasileira de Saúde Coletiva/ABRASCO, Associação Brasileira de Saúde Mental/ABRASME, Centro Brasileiro de Estudos em Saúde/CEBES, Conselho Federal de Psicologia/CFP, Federação Nacional dos Psicólogos/FENAPSI, Movimento Nacional de Direitos Humanos/MNDH, Movimento Nacional da Luta Antimanicomial/MNLA, Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial/RENILA, em nome de mais de 600 outras entidades, formadas por professores universitários, trabalhadores de saúde e usuários e familiares de serviços de saúde mental, vêm, com urgência, apresentar e esclarecer a V. Exa. o que se segue.
A Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas vem sendo construída nas últimas décadas de forma coletiva, tendo como principal pilar a garantia de direitos humanos, contrapondo-se a qualquer forma de institucionalização, tortura e violação de direitos, situações estas presentes em toda história asilar no Brasil. Como demonstração dessa triste e grave realidade brasileira, podemos citar a condenação do Estado Brasileiro pela Corte Internacional de Direitos Humanos da OEA pelo caso de Damião Ximenes, morto em decorrência de negligência e maus tratos quando internado em clínica psiquiátrica privada.
Foi nos Governos Lula e Dilma, que tivemos a formulação de estratégias mais potentes de enfrentamento das situações de violação de direitos dentro dos hospitais psiquiátricos e os maiores avanços no campo da saúde mental, a saber: a instituição da Rede de Atenção Psicossocial – RAPS, dando à política o status de política de Estado, com um crescimento expressivo de serviços comunitários de saúde mental, chegando a 2.300 Centros de Atenção Psicossociais – CAPS, dentre outros, em substituição aos hospitais psiquiátricos. Foi no seu governo que foram inaugurados programas preventivos ao uso problemático de drogas mais potentes, em parceria com a OMS, OPAS e UNODC e instituído um Plano Intersetorial de atenção à pessoas que consomem drogas. Porém, de forma paradoxal, desde dezembro de 2015, temos vivenciado uma real e intensa ameaça às conquistas realizadas.
São de conhecimento público as manifestações que estão ocorrendo em todo Brasil, realizadas por movimentos da luta antimanicomial e de entidades ligadas à defesa da saúde pública brasileira, motivadas pela nomeação do Sr. Valencius Wurch Duarte Filho para o cargo de Coordenador Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde.
Valencius Wurch carrega consigo a marca histórica de ter sido diretor clínico do maior hospital psiquiátrico da América Latina, de 1993 a 1998, a Casa de Saúde Dr. Eiras, em Paracambi (RJ). Importante ressaltar que a Casa de Saúde Dr. Eiras, foi fechada em 2012, por intervenção federal, depois de graves denúncias de violações de direitos humanos cometidas contras internos. Além disso, Valencius Wurch nunca realizou práticas relevantes nos serviços da Rede de Atenção à Saúde, nem atuou no processo de transformação do modelo manicomial para a Atenção Psicossocial da Política Nacional de Saúde Mental, política exitosa do seu Governo e do Governo Lula, o que confere a certeza de sua inadequação para o cargo.
Após a nomeação anunciada pelo ministro da Saúde, centenas de entidades nacionais e internacionais publicaram moções de repúdio ao ato do Sr. ministro e cartas de apoio às manifestações que se iniciaram, que foram entregues pessoalmente ao Sr. Ministro. As inúmeras manifestações foram acompanhadas de várias outras ações político-institucionais de caráter nacional em torno desta demanda:
– 10 de dezembro: 1ª audiência do ministro da Saúde com entidades, representantes das 566 organizações e coletivos da saúde pública e saúde mental;
– 14 de dezembro: Realização do “AbraçaRAPS”, ato em que coletivos da luta antimanicomial de 96 municípios, de todas as Regiões do país, realizaram uma corrente de abraço em torno de serviços de saúde mental, em ato simbólico à defesa e manutenção da politica pública na área;
– 15 de dezembro: Ocupação pacífica e legítima, por movimentos sociais, da sala da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas, do Ministério da Saúde, ato que permanece até os dias atuais;
– 15 de dezembro: 2ª audiência do ministro da Saúde com entidades, representantes das 566 organizações e coletivos da saúde pública e saúde mental;
– 17 de dezembro: audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, sob a presidência da Dep. Érika Kokay, para a qual foi convidado o Sr. ministro da Saúde, que não compareceu;
– 29 de dezembro: 3ª audiência do ministro da Saúde com entidades, representantes das 566 organizações e coletivos da saúde pública e saúde mental.
Sobre as audiências ocorridas com o ministro da Saúde, destacamos que, na primeira (10/12), foi proposta a manutenção do até então coordenador da política de saúde mental, Sr. Roberto Tykanori. Na segunda (15/12), não tendo sido considerado o pedido e uma vez já nomeado Valencius Wurch, as entidades solicitaram-lhe a revogação do ato administrativo, como um gesto de grandeza e de diálogo com os movimentos sociais que se avolumaram e se reorganizaram em todo o país. Porém, o Ministro da Saúde não aceitou os argumentos apresentados como suficientes para que declinasse de sua posição. Na terceira (29/12), por ele chamada uma hora antes de audiência agendada pelos movimentos sociais na Casa Civil, o ministro permaneceu irredutível às solicitações, julgando infundadas as nossas preocupações relativas aos rumos da Política Nacional de Saúde Mental, e reafirmando solenemente sua posição sem qualquer aceno de negociação.
É público e notório o risco de retrocesso histórico na política pública internacionalmente reconhecida e elogiada, vez que esta não se reduz à nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho, pois acima dele, no cargo de diretor do Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas/DAPES, também foi nomeado o médico psiquiatra Sr. Maurício Viana, com experiência manicomial na Colônia Juliano Moreira (RJ). Acima deste, encontra-se Alberto Beltrame, da Secretaria de Atenção à Saúde/SAS, dono de comunidade terapêutica no Rio Grande do Sul e próximo do Dep. Osmar Terra, relator do PL n. 7663/2010, que pretende facilitar o financiamento desses simulacros de manicômio, que vão na contramão dos princípios da Reforma Psiquiátrica brasileira, quais sejam: o cuidado em liberdade, autonomia e garantia dos direitos humanos. O quadro hierárquico se completa com a trajetória do próprio ministro da Saúde, médico psiquiatra afastado das funções profissionais desde a década de 80, que, mesmo durante seus 7 mandatos parlamentares, não produziu nenhuma ação relevante no processo histórico da Reforma Psiquiátrica brasileira, como é de conhecimento público. Em coerência com a sua trajetória, vale destacar que na audiência do dia 10 de dezembro, o ministro afirmou que o Hospital Psiquiátrico é a resposta para o cuidado de pessoas com transtorno mental, o que é incompatível com a Política Nacional de Saúde Mental, desde 2001. Para nossa surpresa, na audiência do dia 29 de dezembro, chegou a afirmar nunca ter lido uma Portaria ministerial sobre a mesma Política. Com essas afirmações, fica clara a posição política do ministro da Saúde desvinculada da Política Nacional de Saúde Mental, o que se concretiza, de início, pela nomeação equivocada de Valencius Wurch e anuncia o risco ao qual nos referimos.
Há de se registrar que mesmo em governos considerados de direita, afetos ao Estado mínimo, a exemplo do governo FHC, foram nomeados para esse cargo pessoas com interesses e atuações afins à Reforma Psiquiátrica Antimanicomial, alinhadas aos seus pressupostos e às diretrizes da Organização Mundial de Saúde.
A discordância com a nomeação do referido coordenador não visa a questionar o poder discricionário do Sr. ministro da Saúde, mas defender as conquistas alcançadas na execução da Política Nacional de Saúde Mental, resultantes da atuação das gestões na referida Coordenação defendidas e mantidas nos mandatos do ex-presidente Lula e de Vossa Excelência. É importante que se diga que a III Conferência Nacional de Saúde Mental estabelece critérios mínimos sobre o perfil adequado para a ocupação do cargo em questão, tendo sido todos esses critérios desconsiderados pelo ministro da Saúde com a nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho.
Na medida em que o Ministro da Saúde afirma-se intransigente perante o pedido de revogação, os movimentos/entidades abaixo-assinados solicitaram à Casa Civil, em caráter de urgência, a detalhada análise das seguintes providências possíveis:
1) Revogação imediata da nomeação do Sr. Valencius Wurch Duarte Filho;
2) Respeito às deliberações oriundas da III Conferência Nacional de Saúde Mental, sobretudo no que tange aos critérios que definem o perfil adequado ao cargo em questão para garantir-se nova nomeação coerente às diretrizes da Política Nacional;
3) Negociação com os movimentos sociais da Reforma Psiquiátrica para a indicação de nome representativo e reconhecido nacionalmente que garanta a continuidade de uma das grandes politicas nacionais de saúde e de direitos humanos do país, conforme deliberações da III Conferência Nacional de Saúde Mental.
Cabe dizer que o movimento social permanecerá cumprindo sua função de fazer o controle social no sentido de garantir a continuidade da Política Nacional de Saúde Mental instituída e de não permitir retrocessos no campo dos direitos humanos e de saúde da população com transtorno mental. Consideramos importante enfatizar, ainda, que coletivos de todo o Brasil estão se organizando para virem a Brasília manifestar sua insatisfação com a nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho e que a tendência é que as manifestações se ampliem por todo o país, enquanto o movimento social não for considerado em suas mais profundas, históricas e legitimas reivindicações.
Encaminhamos, anexo a esse ofício, (1) documento já protocolado na Casa Civil, que reúne cartas solicitando audiência com o Ministro da Saúde com a assinatura de 566 entidades, além da carta do colegiado de coordenadores de saúde mental de todo o país; (2) dossiê com as cartas e moções de apoio à nossa solicitação, bem como (3) manifestações e documentos institucionais e matérias de imprensa com posicionamentos contrários a nomeação realizada, todos estes documentos já entregues e de conhecimento do Sr. ministro.
Conclamando sua atenção, em nome de sua atuação politica exemplar em tempos ainda piores em termos de intransigência e de sua história de vida, marcada também por tortura e violação de direitos. Elevamos nossos corações, mentes e ações para que a sua possível intercessão considere a dor dos que mais demandam a maior proteção possível dos estados e dos governos, qual seja a pessoa com transtorno mental, secularmente alijada dos processos de cidadania na história da humanidade e garanta a continuidade, no seu governo, de uma política consistente e radicalmente compromissada com os direitos humanos. Diante do exposto, solicitamos a V. Ex. que interceda junto ao Ministério da Saúde no que tange a problemática colocada e receba em audiência os representantes das entidades abaixo-assinadas.
Subscrevem a presente, em nome da demais constantes dos documentos anexados, as entidades abaixo-assinadas:
Associação Brasileira de Saúde Coletiva/ABRASCO
Associação Brasileira de Saúde Mental/ABRASME
Centro Brasileiro de Estudos em Saúde/CEBES
Conselho Federal de Psicologia/CFP
Federal Nacional dos Psicólogos/FENAPSI
Movimento Nacional de Direitos Humanos/MNDH
Movimento Nacional da Luta Antimanicomial/MNLA
Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial/RENILA
Fonte: ABRASCO
Presidenta da República Federativa do Brasil
A Associação Brasileira de Saúde Coletiva/ABRASCO, Associação Brasileira de Saúde Mental/ABRASME, Centro Brasileiro de Estudos em Saúde/CEBES, Conselho Federal de Psicologia/CFP, Federação Nacional dos Psicólogos/FENAPSI, Movimento Nacional de Direitos Humanos/MNDH, Movimento Nacional da Luta Antimanicomial/MNLA, Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial/RENILA, em nome de mais de 600 outras entidades, formadas por professores universitários, trabalhadores de saúde e usuários e familiares de serviços de saúde mental, vêm, com urgência, apresentar e esclarecer a V. Exa. o que se segue.
A Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas vem sendo construída nas últimas décadas de forma coletiva, tendo como principal pilar a garantia de direitos humanos, contrapondo-se a qualquer forma de institucionalização, tortura e violação de direitos, situações estas presentes em toda história asilar no Brasil. Como demonstração dessa triste e grave realidade brasileira, podemos citar a condenação do Estado Brasileiro pela Corte Internacional de Direitos Humanos da OEA pelo caso de Damião Ximenes, morto em decorrência de negligência e maus tratos quando internado em clínica psiquiátrica privada.
Foi nos Governos Lula e Dilma, que tivemos a formulação de estratégias mais potentes de enfrentamento das situações de violação de direitos dentro dos hospitais psiquiátricos e os maiores avanços no campo da saúde mental, a saber: a instituição da Rede de Atenção Psicossocial – RAPS, dando à política o status de política de Estado, com um crescimento expressivo de serviços comunitários de saúde mental, chegando a 2.300 Centros de Atenção Psicossociais – CAPS, dentre outros, em substituição aos hospitais psiquiátricos. Foi no seu governo que foram inaugurados programas preventivos ao uso problemático de drogas mais potentes, em parceria com a OMS, OPAS e UNODC e instituído um Plano Intersetorial de atenção à pessoas que consomem drogas. Porém, de forma paradoxal, desde dezembro de 2015, temos vivenciado uma real e intensa ameaça às conquistas realizadas.
São de conhecimento público as manifestações que estão ocorrendo em todo Brasil, realizadas por movimentos da luta antimanicomial e de entidades ligadas à defesa da saúde pública brasileira, motivadas pela nomeação do Sr. Valencius Wurch Duarte Filho para o cargo de Coordenador Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde.
Valencius Wurch carrega consigo a marca histórica de ter sido diretor clínico do maior hospital psiquiátrico da América Latina, de 1993 a 1998, a Casa de Saúde Dr. Eiras, em Paracambi (RJ). Importante ressaltar que a Casa de Saúde Dr. Eiras, foi fechada em 2012, por intervenção federal, depois de graves denúncias de violações de direitos humanos cometidas contras internos. Além disso, Valencius Wurch nunca realizou práticas relevantes nos serviços da Rede de Atenção à Saúde, nem atuou no processo de transformação do modelo manicomial para a Atenção Psicossocial da Política Nacional de Saúde Mental, política exitosa do seu Governo e do Governo Lula, o que confere a certeza de sua inadequação para o cargo.
Após a nomeação anunciada pelo ministro da Saúde, centenas de entidades nacionais e internacionais publicaram moções de repúdio ao ato do Sr. ministro e cartas de apoio às manifestações que se iniciaram, que foram entregues pessoalmente ao Sr. Ministro. As inúmeras manifestações foram acompanhadas de várias outras ações político-institucionais de caráter nacional em torno desta demanda:
– 10 de dezembro: 1ª audiência do ministro da Saúde com entidades, representantes das 566 organizações e coletivos da saúde pública e saúde mental;
– 14 de dezembro: Realização do “AbraçaRAPS”, ato em que coletivos da luta antimanicomial de 96 municípios, de todas as Regiões do país, realizaram uma corrente de abraço em torno de serviços de saúde mental, em ato simbólico à defesa e manutenção da politica pública na área;
– 15 de dezembro: Ocupação pacífica e legítima, por movimentos sociais, da sala da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas, do Ministério da Saúde, ato que permanece até os dias atuais;
– 15 de dezembro: 2ª audiência do ministro da Saúde com entidades, representantes das 566 organizações e coletivos da saúde pública e saúde mental;
– 17 de dezembro: audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, sob a presidência da Dep. Érika Kokay, para a qual foi convidado o Sr. ministro da Saúde, que não compareceu;
– 29 de dezembro: 3ª audiência do ministro da Saúde com entidades, representantes das 566 organizações e coletivos da saúde pública e saúde mental.
Sobre as audiências ocorridas com o ministro da Saúde, destacamos que, na primeira (10/12), foi proposta a manutenção do até então coordenador da política de saúde mental, Sr. Roberto Tykanori. Na segunda (15/12), não tendo sido considerado o pedido e uma vez já nomeado Valencius Wurch, as entidades solicitaram-lhe a revogação do ato administrativo, como um gesto de grandeza e de diálogo com os movimentos sociais que se avolumaram e se reorganizaram em todo o país. Porém, o Ministro da Saúde não aceitou os argumentos apresentados como suficientes para que declinasse de sua posição. Na terceira (29/12), por ele chamada uma hora antes de audiência agendada pelos movimentos sociais na Casa Civil, o ministro permaneceu irredutível às solicitações, julgando infundadas as nossas preocupações relativas aos rumos da Política Nacional de Saúde Mental, e reafirmando solenemente sua posição sem qualquer aceno de negociação.
É público e notório o risco de retrocesso histórico na política pública internacionalmente reconhecida e elogiada, vez que esta não se reduz à nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho, pois acima dele, no cargo de diretor do Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas/DAPES, também foi nomeado o médico psiquiatra Sr. Maurício Viana, com experiência manicomial na Colônia Juliano Moreira (RJ). Acima deste, encontra-se Alberto Beltrame, da Secretaria de Atenção à Saúde/SAS, dono de comunidade terapêutica no Rio Grande do Sul e próximo do Dep. Osmar Terra, relator do PL n. 7663/2010, que pretende facilitar o financiamento desses simulacros de manicômio, que vão na contramão dos princípios da Reforma Psiquiátrica brasileira, quais sejam: o cuidado em liberdade, autonomia e garantia dos direitos humanos. O quadro hierárquico se completa com a trajetória do próprio ministro da Saúde, médico psiquiatra afastado das funções profissionais desde a década de 80, que, mesmo durante seus 7 mandatos parlamentares, não produziu nenhuma ação relevante no processo histórico da Reforma Psiquiátrica brasileira, como é de conhecimento público. Em coerência com a sua trajetória, vale destacar que na audiência do dia 10 de dezembro, o ministro afirmou que o Hospital Psiquiátrico é a resposta para o cuidado de pessoas com transtorno mental, o que é incompatível com a Política Nacional de Saúde Mental, desde 2001. Para nossa surpresa, na audiência do dia 29 de dezembro, chegou a afirmar nunca ter lido uma Portaria ministerial sobre a mesma Política. Com essas afirmações, fica clara a posição política do ministro da Saúde desvinculada da Política Nacional de Saúde Mental, o que se concretiza, de início, pela nomeação equivocada de Valencius Wurch e anuncia o risco ao qual nos referimos.
Há de se registrar que mesmo em governos considerados de direita, afetos ao Estado mínimo, a exemplo do governo FHC, foram nomeados para esse cargo pessoas com interesses e atuações afins à Reforma Psiquiátrica Antimanicomial, alinhadas aos seus pressupostos e às diretrizes da Organização Mundial de Saúde.
A discordância com a nomeação do referido coordenador não visa a questionar o poder discricionário do Sr. ministro da Saúde, mas defender as conquistas alcançadas na execução da Política Nacional de Saúde Mental, resultantes da atuação das gestões na referida Coordenação defendidas e mantidas nos mandatos do ex-presidente Lula e de Vossa Excelência. É importante que se diga que a III Conferência Nacional de Saúde Mental estabelece critérios mínimos sobre o perfil adequado para a ocupação do cargo em questão, tendo sido todos esses critérios desconsiderados pelo ministro da Saúde com a nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho.
Na medida em que o Ministro da Saúde afirma-se intransigente perante o pedido de revogação, os movimentos/entidades abaixo-assinados solicitaram à Casa Civil, em caráter de urgência, a detalhada análise das seguintes providências possíveis:
1) Revogação imediata da nomeação do Sr. Valencius Wurch Duarte Filho;
2) Respeito às deliberações oriundas da III Conferência Nacional de Saúde Mental, sobretudo no que tange aos critérios que definem o perfil adequado ao cargo em questão para garantir-se nova nomeação coerente às diretrizes da Política Nacional;
3) Negociação com os movimentos sociais da Reforma Psiquiátrica para a indicação de nome representativo e reconhecido nacionalmente que garanta a continuidade de uma das grandes politicas nacionais de saúde e de direitos humanos do país, conforme deliberações da III Conferência Nacional de Saúde Mental.
Cabe dizer que o movimento social permanecerá cumprindo sua função de fazer o controle social no sentido de garantir a continuidade da Política Nacional de Saúde Mental instituída e de não permitir retrocessos no campo dos direitos humanos e de saúde da população com transtorno mental. Consideramos importante enfatizar, ainda, que coletivos de todo o Brasil estão se organizando para virem a Brasília manifestar sua insatisfação com a nomeação do Sr. Valencius Duarte Filho e que a tendência é que as manifestações se ampliem por todo o país, enquanto o movimento social não for considerado em suas mais profundas, históricas e legitimas reivindicações.
Encaminhamos, anexo a esse ofício, (1) documento já protocolado na Casa Civil, que reúne cartas solicitando audiência com o Ministro da Saúde com a assinatura de 566 entidades, além da carta do colegiado de coordenadores de saúde mental de todo o país; (2) dossiê com as cartas e moções de apoio à nossa solicitação, bem como (3) manifestações e documentos institucionais e matérias de imprensa com posicionamentos contrários a nomeação realizada, todos estes documentos já entregues e de conhecimento do Sr. ministro.
Conclamando sua atenção, em nome de sua atuação politica exemplar em tempos ainda piores em termos de intransigência e de sua história de vida, marcada também por tortura e violação de direitos. Elevamos nossos corações, mentes e ações para que a sua possível intercessão considere a dor dos que mais demandam a maior proteção possível dos estados e dos governos, qual seja a pessoa com transtorno mental, secularmente alijada dos processos de cidadania na história da humanidade e garanta a continuidade, no seu governo, de uma política consistente e radicalmente compromissada com os direitos humanos. Diante do exposto, solicitamos a V. Ex. que interceda junto ao Ministério da Saúde no que tange a problemática colocada e receba em audiência os representantes das entidades abaixo-assinadas.
Subscrevem a presente, em nome da demais constantes dos documentos anexados, as entidades abaixo-assinadas:
Associação Brasileira de Saúde Coletiva/ABRASCO
Associação Brasileira de Saúde Mental/ABRASME
Centro Brasileiro de Estudos em Saúde/CEBES
Conselho Federal de Psicologia/CFP
Federal Nacional dos Psicólogos/FENAPSI
Movimento Nacional de Direitos Humanos/MNDH
Movimento Nacional da Luta Antimanicomial/MNLA
Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial/RENILA
Fonte: ABRASCO
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