fevereiro 20, 2009

O Porto das Lajes e o IIRSA

Encontro das Águas visto das Lajes - Manaus-Amazonas-Brasil
Nota do blog: Toda a área vista na imagem acima, no local conhecido como Lajes, onde encontram-se falésias com fósseis datados de milhões de anos, e que fica em frente do Encontro das Águas (patrimônio natural da humanidade), será afetada pelo porto que a Superintendência da Zona Franca de Manaus pretende construir logo a jusante. Ao centro, vê-se a torre da Embratel; ao lado, à direita, uma instituição nipo-brasileira responsável pelo reflorestamento de uma área degradada, que enche de vergonha o poder público, que não tem uma iniciativa igual em toda a orla do rio Negro, rio que banha a bela Manaus. Leia abaixo um outro ângulo da questão do Porto das Lajes que vem passando ao largo da discussão.

O Porto das Lajes e o IIRSA


Matéria assinada por Carlos Tautz, publicada no Le Monde diplomatique Brasil, edição de fevereiro, dá preciosas indicações sobre os interesses envolvidos em grandes projetos nas áreas de transporte, energia e comunicações na América Latina.

Segundo Tautz, cada um de seus eixos tem como objetivo “dotar a região de infraestrutura para extrair, em níveis nunca vistos, todo tipo de commodities, exportando-os para os mercados consumidores mais ricos”.

Ora, ora! explicado o projeto de construção do Porto das Lajes no Encontro das Águas do rio Negro com o rio Solimões, justamente onde ele passa a chamar-se rio Amazonas. Se é assustadora a previsão do impacto ambiental contra esse patrimônio da humanidade - não é à toa que os ambientalistas estão de cabelos em pé -, mais intrigante são os antecedentes históricos que dão sustentação a esse crime contra a humanidade.

Dando nomes aos bois

Tautz afirma que tais projetos nasceram com o objetivo de aproximar a América Latina dos pólos dinâmicos da economia capitalista, sendo denominado como Iniciativa de Integração da Infraestrutura Sul-americana (IIRSA). Autor da façanha: FHC.

Concebida no final dos anos 1990, só em agosto de 2000 Fernando Henrique Cardoso, presidente da república, chamou 11 outros colegas do continente – entre eles ditadores comprometidos por graves denúncias de corrupção, e até um que seria derrubado por um movimento popular sob a acusação de ter capitulado diante dos interesses dos Estados Unidos – para ditar o tom da nova agenda liderada pelos estrategistas neoliberais norte-americanos: radicalizar a liberdade de comércio.

O que nós, mortais comuns, acossados na luta pela sobrevivência no país recordista em impostos exdrúxulos não sabíamos é que por trás da idéia concebida pelo Brasil, e consolidada num trabalho elaborado pelos consultores do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), estava o indefectível Eliezer Batista, ex-presidente da Vale do Rio Doce e ex-ministro de assuntos estratégicos, agora um zeloso consultor a serviço da lógica neoliberal do Consenso de Washington.

Que curioso! O antropólogo Ademir Ramos, do Núcleo de Cultura Política do Estado do Amazonas, em entrevista ao Semanário Repórter, de Manaus, declara a propósito dos interesses envolvidos na construção do Porto das Lajes no Encontro das Águas, que tem na empresa Lajes Logística S/A seu preposto:

“A bem da verdade, a empresa estruturante desse empreendimento é a Vale do Rio
Doce, que desde 2001, por meio do seu executivo de frente, Sergio Gabizo, vem
gerenciando os contratos entre a Aliança Navegação e Logística Ltda. e a
Docenave, do grupo Vale do Rio Doce, que fecharam acordo na época para aumentar
a freqüência e o número de navios entre os principais portos do Mercosul
(Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai). As duas companhias estão entre as
maiores do setor de navegação do País, no transporte de contêineres a longa
distância e cabotagem. O concorrente desse mercado são as empresas de transporte
rodoviário. Mas, futuramente estarão compondo o consórcio. O que falta é
transparência, separando bem o público do privado e, sobretudo a cobrança sobre
as empresas quanto à sua responsabilidade social e ambiental”.

O que quer a IIRSA?

Bueno, até aí morreu Neves! Com os pilares do pensamento neoliberal abalados, por que os agentes políticos e econômicos não perderam o fôlego e ainda vicejam à sombra do decálogo do Consenso de Washington?

Para Tautz, nem Hugo Chavez – único presidente a emitir sinais de antipatia ao IIRSA, e que ajudou a sepultar a Alca (lembram dela?) – foi capaz de fazer análise mais minuciosa do que estava e está em jogo: a negociação de recursos naturais estratégicos.

Quem matou a charada foi a professora da Universidade Autônoma do México, coordenadora do Observatório de Geopolítica do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso), Ana Esther. Segundo Tautz, foi ela quem elaborou o mapa das zonas de influência da presença militar dos EUA na América Latina. Ao sobrepô-lo ao mapa da ocorrência de recursos naturais, percebeu que ambos coincidem.

Ora, ora! Assim estão explicadas as garantias oferecidas aos agentes econômicos, habituados a liberar recursos quando, apenas e tão somente, há certeza plena do retorno dos seus investimentos. Capice? Não bastam contratos a serem contestados nos tribunais, os agentes querem, também, outras seguranças, afirma Tautz.

Well! Nesse contexto, vale lembrar que o BID há décadas é presidido pelos EUA. Não é à toa que sobre ele recaiu a escolha para ser a secretária técnica e o captador de recursos junto a organismos financeiros regionais para ajudar o IIRSA.

Vai pensando aí. Voltaremos ao assunto.
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