fevereiro 28, 2009

Conflitos pela terra

Foto: MST

EM DEBATE: Conflitos pela terra

Quatro pistoleiros foram mortos ao tentar invadir um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O acampamento com o nome de Consulta está localizado no município de São Joaquim do Monte, agreste de Pernambuco (PE). O fato aconteceu no último sábado (21). Os jagunços que estavam fortemente armados tentavam realizar uma expulsão extra-judicial no local.

A coordenação do acampamento convocou a polícia para denunciar a tentativa de massacre contra os acampados. Mas, ao chegar ao local, a polícia prendeu dois trabalhadores. Nas fotos e vídeo gravados no momento do ataque, consta a violência dos pistoleiros, que fez com que os trabalhadores agissem em legítima defesa.

Em entrevista à Radioagência NP, o integrante da coordenação nacional do MST em Pernambuco, Jaime Amorim, fala do histórico de violência contra trabalhadores no estado e denuncia a imobilidade no avanço da reforma agrária na região. Ele afirma que o conflito na região ocorre desde abril de 2002 - época em que as fazendas Consulta e Jabuticaba foram ocupadas. Desde então, foram vários despejos realizados pela Polícia Militar e ameaças permanentes contra os trabalhadores por parte de pistoleiros e milícias armadas. A área disputada tem aproximadamente 1,5 mil hectares.

Radioagência NP: A Polícia local podia ter feito algo para impedir o conflito?

Jaime Amorim:
Registramos o início do conflito com fotos. Quando a polícia chegou, mostramos as fotos para os policias, pedimos que algo fosse feito. Os policiais simplesmente disseram “deixa para lá, isso já aconteceu, eles já foram embora”. Logo em seguida aconteceu o fato. Neste exato momento, nós estávamos denunciando um conflito no município de Águas Belas [PE]. A proprietária da fazenda Nova contratou mais de 20 pistoleiros para uma expulsão extra-judicial. Isso é visível. Há um alerta da própria prefeitura da cidade. Nós já denunciamos isso para o governo do estado e polícia, mas ninguém adota providência. A qualquer hora pode haver uma chacina também em Águas Belas. Infelizmente a polícia convive com isso.

RNP: Qual o histórico de conflito na área?

J.A:
Este processo está se desenrolando desde 2002. Sempre havia conflitos nos despejos e ocupações da área. A situação mais tensa foi em 2006. Na ocasião, houve uma reintegração de posse. Depois da reintegração, o fazendeiro colocou pistoleiros com trator e máquinas para destruir mais de 120 hectares da lavoura dos trabalhadores. Com isso, a situação ficava sempre tensa. Os trabalhadores ocupavam, ficavam no local até uma nova reintegração, aí vinha o despejo e depois nova ocupação. E este problema se acirrou ainda mais quando o proprietário [Sr. Estermilton Guedes] contratou uma milícia armada para impedir a ocupação, isso porque, mesmo depois de dada esta ocupação, a milícia foi até o local para fazer uma reintegração de posse na base da força. Estava claro que o resultado destes fatos seria este conflito.

RNP: Mesmo a área sendo improdutiva, por que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) não desapropriou as fazendas Jabuticaba e Consulta?

J.A:
Durante todo este período, o Incra não conseguiu desapropriar as terras, porque havia um vínculo entre o cartório do registro de imóveis rurais da cidade e o juiz local. Tanto é que até hoje o proprietário manipula a certidão de imóvel da fazenda Jabuticaba. O Incra não conseguiu até hoje a certidão da área, fato que impede o Instituto de concluir o processo de desapropriação. Da mesma forma aconteceu com a fazenda Consulta. Ela foi subdividada durante o processo de desapropriação. Isso é proibido quando o Incra inicia o processo. Ele trava o CCIR [Certificado de Cadastro de Imóvel Rural], com isso o proprietário e o cartório também ficam inibidos de fazer qualquer transação legal com a área. Em função disso, mesmo depois de tanto tempo, não houve a desapropriação.

RNP: Fale sobre o histórico de violência no estado de Pernambuco.

J.A:
O maior conflito ocorreu em 1996, quando foi ocupado o Engenho Camarazal. No local, duas pessoas foram assassinadas e duas mulheres e três crianças foram feridas à bala. Desde então, várias pessoas foram assassinadas em Quipapá e Moreno. Neste segundo, foram mortos os companheiros Josias e Samuel. Há uma violência permanente principalmente na Zona da Mata, onde as usinas e os senhores de engenho contratam seguranças armados para matar.

RNP: Como está o quadro de desapropriação no estado?

J.A: Esta é talvez a situação mais grave. Há quase três anos, o Incra não consegue desapropriar praticamente nada aqui em Pernambuco. No último ano, tivemos somente uma área desapropriada que foi a fazenda São João, que agora se tornou o assentamento Chico Mendes. Aqui em Pernambuco, temos os acampamentos mais antigos do Brasil. São cerca de 80 acampamentos, todos com dez e 11 anos de existência. E isso é ruim. A cada ano que passa as famílias ficam mais desesperançosas. A incapacidade do Incra em ser enérgico talvez seja a pior questão que temos aqui, ou seja, ele não utiliza a força que tem para fazer cumprir o que determina a legislação brasileira.

De São Paulo, da Radioagência NP, Juliano Domingues.

26/02/09

Fonte: Radioagência Notícias do Planalto

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