PICICA: " Estreia essa semana (30/07) o filme de
aurélio Michiles, intitulado “Tudo por Amor ao Cinema” que conta a
história da vida de Cosme Alves Netto, um estudioso do cinema brasileiro
e que dirigiu a cinemateca do MAM (Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro) por mais de três décadas, e é considerado o guardião do cinema
nacional. O diretor do documentário concedeu uma entrevista por e-mail
ao blog Cinema e Movimento (C&M) e falou sobre a
ideia de registrar o trabalho de preservação do cinema realizado por
Cosme Alves Netto e dividi-la com o público, sobre a forma de abordagem
do documentário, sobre as dificuldades e os prazeres de realizar esta
empreitada e sua expectativas e projetos futuros. Confira!"
Entrevista com Aurélio Michiles – diretor do filme “Tudo por Amor ao Cinema”
Aurélio Michiles (Foto: Gabriela Dória – Fonte: Google)
Estreia essa semana (30/07) o filme de
aurélio Michiles, intitulado “Tudo por Amor ao Cinema” que conta a
história da vida de Cosme Alves Netto, um estudioso do cinema brasileiro
e que dirigiu a cinemateca do MAM (Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro) por mais de três décadas, e é considerado o guardião do cinema
nacional. O diretor do documentário concedeu uma entrevista por e-mail
ao blog Cinema e Movimento (C&M) e falou sobre a
ideia de registrar o trabalho de preservação do cinema realizado por
Cosme Alves Netto e dividi-la com o público, sobre a forma de abordagem
do documentário, sobre as dificuldades e os prazeres de realizar esta
empreitada e sua expectativas e projetos futuros. Confira!
C&M:Como foi que surgiu a ideia de registrar o trabalho de preservação de memória e de amor ao cinema de Cosme Alves Netto?
Aurélio: Não fazia parte
dos meus objetivos realizar um filme-doc sobre o Cosme, não que ele não
merecesse…Encontrava-me envolvido com outros conteúdos, mas
infelizmente não consegui avançar… e, aí bateu aquela depressão
pós-projeto frustrado, fiquei um pouco à deriva…Em 2006, encontrava-se
como juri da Jornada da Bahia (festival de cinema) quando também
celebrava-se a memória do Cosme, e num jantar o Thomaz Farkas e o Rudá
Andrade me fizeram uma provocação, “faça um doc sobre o Cosme”. E aquilo
ficou como uma semente jogado numa terra úmida… Somente dois anos
depois assumi que realizaria o filme. Enquanto acontecia a formatação do
projeto e conseguir os recursos necessários para realiza-lo passaram-se
5 anos. Ganhei um edital da Petrobras Cultural, logo depois o PROAC –
Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo…e aí não parou mais. Neste
meio tempo, antes que conseguisse entrevista-los, tanto o Rudá como o
Thomaz rumaram para a eternidade e foram se encontrar com o Cosme no céu
dos astros e estrelas do cinema.
Aurélio: A narrativa
estética-conceitual foi optar em contar a sua vida através de curtas
cenas de filmes…como se a vida dele fosse ( e é) formada por aqueles
filmes que assistiu e amou. Daí ter escolhido como “tag-line” de Tudo
Por Amor Ao Cinema: “ELE FEZ DOS FILMES A HISTÓRIA DA SUA VIDA”. E, não
poderia ser diferente, na medida que se trata de uma pessoa que viveu
mais tempo dentro de uma cinemateca do que em sua própria casa.
Cosme respirava e transpirava filmes/cinema, ele não mediu dificuldades, ao contrário correu risco de vida por querer preservar a memória fílmica, sobretudo, a brasileira/latino-americana. O fato das cinematecas terem se transformado num lugar reconhecido, aonde pode-se encontrar parte das nossas lembranças, aquelas que nos formaram a partir do entretenimento…podemos dizer que esse é um dos legados do Cosme, afinal, ele doou a sua vida para que existisse essa instituição.
Sempre tive pelo cinema uma referência fundamental para compreender a vida na sua complexidade…são referência culturais, existenciais, antropológicas…Talvez, por isso, sou atraído para realizar filmes-documentários que contem um pouco dessa história…aconteceu com “Que Viva Glauber! (1991), foi o primeiro documentário sobre Glauber Rocha, o cineasta fundamental do século XX, depois “O Cineasta da Selva “(1992) – a história do pioneiro do cinema, não somente amazônico, mas mundial e agora “Tudo Por Amor Ao Cinema”, a historia de um personagem que se preocupou em guardar e preservar a memória do cinema. Essa trilogia aconteceu por acaso.
C&M: Quais foram as maiores dificuldades e/ou o (s) maior(es) prazer (eres) em fazer o filme?
Aurélio: Conheci o
Cosme, na verdade foi ele que me conheceu…depois de realizar esse filme
sobre ele tenho a certeza que ele foi mais meu amigo do que eu dele.
Quando, no inicio dos anos 80, ele soube que um jovem no Amazonas havia
realizado documentários em Manaus, ele me enviou um telegrama dizendo
que gostaria de me conhecer. Depois recebi uma carta do Cosme dizendo
que estaria de passagem por Manaus e queria conversar comigo…daí, em
diante foi uma cumplicidade de todo o sempre. Ele sempre me provocando e
me alimentando com desafios, por exemplo, depois que realizei o
documentário “Que Viva Glauber!”(1991), o Cosme me telefonou dizendo que
agora era a vez de fazer uma cinebiografia sobre o Silvino Santos…Ele
enviava pelos correios pacotes com documentos sobre o pioneiro do
cinema. Finalmente, em 1996, quando conseguimos levantar os recursos
para a produção do filme “O Cineasta da Selva”, o Cosme que já se
encontrava com a saúde bastante delicada…veio a falecer. O filme é
dedicado a ele, inclusive filmei uma cena em sua homenagem. O Cosme,
apesar de ter sido protagonista na historia do cinema brasileiro entre
os anos 60 a 80, ele, quando resolvi realizar o filme encontrava-se no
limbo da memória, foi preciso refrescar com muito empenho as pessoas e
os investidores para reconhecer nele uma boa historia a ser contada.
Em junho, deste ano, a Cinemateca de Cuba, realizou a mostra “Panorama del Cine Brasileño” com filmes desde a década de 30 até século XXI e eles selecionaram a trilogia: Que Viva Glauber!, O Cineasta da Selva e Tudo Por Amor Ao Cinema. Nós estamos falando do lançamento do filme, mas, ainda quando se encontrava em finalização o filme foi convidado para abrir o “Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade RJ (2014)” e teve uma excepcional recepção de público e da crítica, a partir daí foi acontecendo a sua trajetória pelos festivais de cinemas, sempre despertando forte emoções. Tem sido muito gratificante, é isso que todo realizador deseja para seus trabalhos, né?
C&M: Como foi a escolha
dos entrevistados? Quanto tempo de produção, entre ideia, roteiro,
seleção de filmes, de entrevistados e o produto final?
Aurélio: Um
filme-documentário mais parece com aquele mito grego de “Ariadne” no
labirinto do “Minotauro”…a gente começa com uma idéia, mas, na medida
que vamos aprofundando e penetrando no personagem (assunto) surgem
muitas possibilidades narrativas e aí forma-se o desafio em optar por um
caminho, senão corre-se o risco de perder-se ao meio do labirinto…e aí o
“Minotauro” faz aquele estrago, né? Com esta cinebiografia sobre o
Cosme não foi diferente…um amazonense que foi morar muito cedo no Rio de
Janeiro e torna-se o mais longevo diretor da Cinemateca do Museu de
Arte Moderna e mais…transforma aquele espaço numa referência de agito
cultural, numa verdadeiro rio Amazonas de ideias e criatividade. Tudo
isso em pleno anos da ditadura, quando tudo era proibido e desafiar esse
proibido corria-se o risco de morrer. Ao cair no labirinto “cosmeano”
fui encontrando uma multidão de pessoas que o conheceram e cada uma
delas tinha um “causo-cósmico” para contar. Cosme foi amado, admirado e
até mesmo cultuado…Seja no Brasil como no exterior…recebi (até hoje)
recebo e-mails de pessoas que o conheceu e tem “uma historia incrível
para contar”….Foram mais de 70 depoimentos…amigos quem moram em Roma,
Chile, Argentina, Peru, Panamá, Cuba, Venezuela, Berlim, Colômbia,
México, França, Portugal e por todo o Brasil (norte, sul, leste e
oeste). E como tínhamos limitação de orçamento optamos por alguns…Na
edição final ficou menos da metade. A maior curiosidade foi descobrir o
irresistível carisma dele, tanto que acabei por defini-lo como
“causos-cósmicos”. Tive que assistir (a partir) de comentários e listas
feita pelo Cosme sobre os seus 10 filmes favoritos, além de outros que
somaram mais de uma centena, além de outros que resolvi assistir por
conta própria…neste processo foram uns 157 filmes ao longo dos 5 anos
que levei para conseguir realiza-lo.
C&M: Quais são suas expectativas em relação a entrada de “Tudo Por Amor Ao Cinema” no circuito?
Aurélio: Eis um assunto
típico do “Labirinto do Minotauro”. Esta excepcionalidade só nos enche
de alegria.. É preciso que se assimile essa demanda da democratização da
produção audiovisual. Agora, é preciso que se diga que esta dificuldade
pode até ser mais presente em Manaus, por exemplo, mas no entanto, em
todo o território nacional, os cineastas brasileiros penam para fazer
chegar os seus filmes no circuito exibidor. Os documentários então…nem
se fala, mas paradoxalmente o Brasil, hoje, é o país aonde se tem mais
filmes-documentários em cartaz. Agora, não se justifica que cidades
brasileira com magnitude econômica-cultural que não consigam exibir a
diversidade da nossa produção doe cinema. Deve existir espaço (lógico),
para os denominados “Blockbuster”, mas é necessário existir, também, um
circuito que dê visibilidade a essa diversidade não somente dos filmes
brasileiros, mas também dos filmes produzidos de diversos países
(América Latina, África, Ásia, os europeus e norte-americanos
independentes)… Agora, o fato de conseguir exibir o meu filme no
circuito comercial, pra mim, têm maior dimensão, por conseguir exibir
Tudo Por Amor Ao Cinema, em Manaus…para os meus iguais, no lugar aonde
nasci. É um sonho que espero que se repita, não somente para mim, mas
para outros realizadores amazonenses…
C&M:Quais são seus projetos futuros?
Aurélio: É difícil falar
de um projeto em processo (futuro ) quando se está focado, com as
energias todas voltados para tornar visível uma produção que se dedicou 5
anos de trabalho. Nós, cineastas, sempre temos vários projetos na
gaveta, na memória e mais algum em processo, com certeza, pretendo em
2017, está aqui neste mesmo espaço, conversando contigo sobre o meu
filme “O Rugido do Mar na Selva”.
Fonte: Cinema & Movimento
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