PICICA 1: Depois de chancelar operações policiais contra as jornadas de 2013, o PT vem, de joelhos, pedir a ocupação das ruas contra o impeachment de Dilma. O provérbio "latino" - "Pimentorium in anus outrem refrescus est" - cai como uma luva, para ilustrar a conjuntura atual.
PICICA 2: "Como disse o Bruno Cava Rodrigues
certa vez, nunca antes na história desse país tantas pessoas avisaram o
que iria acontecer com tantos detalhes e nunca foi tão possível fazer
análises "espetacularmente erradas" quanto nos dois últimos anos. Abaixo
faço uma retrospectiva do meu "eu avisei" [no blog]. Fui apenas uma voz
entre muitas outras que previram o que iria acontecer -- coisa que vem
ocorrendo desde 2013. E um segredo: não precisava ser a Mãe Dinah para
saber. Infelizmente, hoje a vontade tem substituído a razão nas
análises."
11/06/14: "Ainda hoje boa parte da leitura política na blogosfera e mesmo na academia continua girando sobre esse eixo. O PT é o marco definidor da polaridade: de um lado, a mídia conservadora e as oligarquias tradicionais e econômicas (onde não são a mesma coisa); de outro, a resistência do PT e das políticas que se baseiam no trabalho contra o capital. A obsessão anti-midiática dá pano para manga, já que boa parte da imprensa conservadora é de fato pautada pelo anti-petismo e mantém, como pólo invertido, o partido como seu inimigo mortal, apelando a todo tipo de absurdo e casuísmo para provar que o PT é a pior organização do mundo, o eixo do mal, o bando de ladrões de Lula e Dirceu e assim por diante. Tudo isso contrasta com a forma ajoelhada como o PT vem governando o país e a própria incapacidade de assumir um discurso contra essa mídia, simplesmente não negando que possa estar atuando de modo a não repetir a visão da direita acerca do progresso e da melhor forma de se posicionar em torno dos conflitos sociais."
28/08/14: "Em dois momentos, o PT perdeu a chance de romper com o “peemedebismo” e preferiu, ao contrário, alinhar-se a ele. Dois erros estratégicos imperdoáveis. Na eleição de 2010, Lula tinha ampla maioria da população a seu favor e sua sucessora poderia ter adotado uma posição menos alinhada aos setores ultraconservadores da sociedade (oligarquias rurais, religiosos fundamentalistas) usando o capital político acumulado. Em vez disso, ela não apenas se omitiu, mas recuou para posições mais à direita que o próprio Lula em nome das alianças que sustentam seu projeto econômico. Em 2013, o fato se repetiu: em vez de perceber os novos movimentos sociais como parceiros estratégicos que permitiriam ao PT avançar para a esquerda, encampando lutas que enfrentam setores oligárquicos da sociedade, Dilma preferiu ouvir os puxa-sacos governistas que vendiam a imagem de vândalos e coxinhas aos manifestantes, gerando uma ruptura que mudou o perfil do partido. Hoje, em vez de representar o partido mais próximo dos movimentos sociais, como o PT foi ao longo das duas décadas anteriores, o atual governo transformou a sigla em um aglomerado burocrático impermeável às demandas diretas da sociedade e sustentado por uma mídia alinhada que em nada difere dos pitbulls mais reacionários da direita brasileira, adotando o mesmo modus operandi para atacar seus inimigos políticos".
07/09/14: "A vantagem, por outro lado, é que surfa em um clima político de insatisfação bem mais agudo que o de 2002, tendo se expressado fundamentalmente nos movimentos de 2013. As condições “objetivas” favorecem Marina, que acabou identificada por uma significativa parcela dos insatisfeitos, de parte da esquerda à centro-direita, com 2013. Lula não tinha como confrontar o sistema porque a insatisfação não era tão patente. Talvez sob essas condições pudesse ter feito até coisa melhor que Marina pode fazer, mas são as circunstâncias que mudaram, em suma. A figura gerencial de Dilma não convence ninguém na tarefa de enfrentar o sistema político (“peemedebismo”), ainda mais para os que acompanharam com cuidado as suas decisões durante o período."
09/09/14: "Para piorar, uma parte da militância petista resolveu comprar o confronto com os novos movimentos sociais usando, para contrastar com o #naovaitercopa, o lema #vaitercopa, além de recorrer a todo tipo de sofisma para justificar o evento, inclusive a defesa do indefensável. Não que os militantes do #naovaitercopa realmente não quisessem que a Copa se realizasse, mas eles escolheram esse evento para marcar o protesto contra uma forma de crescimento predatório no meio urbano. No lugar de compreender os movimentos, mais uma vez o PT preferiu comprar a briga, inclusive chancelando operações policiais que violaram as mais elementares regras do direito. O spray de pimenta e os cassetetes militares vieram com carimbo petista. O pior nesse caso foi a insistência em denegar os novos atores políticos. Não reconhecendo que os manifestantes estavam lutando por causas justas, o PT preferiu etiquetá-los de “coxinhas” a fim de reenquadrar novamente tudo na polaridade política PT/PSDB, aquela que é facilmente controlável e foi desmanchada em 2013. Os manifestantes que não cabiam exatamente no rótulo foram simplesmente criminalizados, excluídos da política. O PT se embebedou de análises políticas tortas e tendenciosas, preferindo a autoglorificação a uma crítica racional do que vinha ocorrendo.
A saída para o PT não era ter confrontado os manifestantes, mas justamente ter aproveitado o clima político favorável para situar-se mais à esquerda. Até do ponto de vista da estratégia eleitoral, considerando que boa parte dos votos que hoje não estão com o PT são de direita, ele no mínimo precisaria capitalizar a esquerda (sempre minoritária), coisa que hoje em dia não consegue mais. Como o PT se vê como a única alternativa de esquerda, sem reconhecer esses novos atores, precisa ignorar uma parcela significativa de pessoas que seriam inclusive potenciais eleitoras. Precisa ignorar meio mundo, simplesmente fingir que não existe."
06/10/14: "O declínio eleitoral do PT, apesar da arrogância dos seus militantes que achavam por exemplo que poderiam levar no primeiro turno, é um nítido efeito das manifestações de 2013 e de todo processo que as desencadeou. O único consenso sobre as manifestações é que elas são um enigma, mas tenho tentando esboçar algumas leituras sobre elas por aqui.
(...)
Ao invés de dialogar com ambos os setores, o PT preferiu subir no salto alto e se achar na condição de julgador. Etiquetou a pecha de “coxinhas” nos manifestantes e preferiu se afirmar como o suprassumo infalível da esquerda, agarrando-se para tanto em diagnósticos toscos e conspiratórios. Na Copa do Mundo, lançou o lema #vaitercopa e se desconectou totalmente dos movimentos sociais, preferindo reforçar a segurança e a vigilância sobre eles. Até hoje quando o assunto vem à tona sobram julgamentos sobre as manifestações, tidas como “alienadas”, e petistas se vangloriam da proposta de plebiscito constitucional da Presidenta Dilma que não durou um mísero dia. A culpa, no final, é das próprias ruas por enfraquecer o PT. O símbolo dessa visão risível é o sociólogo Emir Sader ter chamado de “vira-latas” movimentos de sem-teto que iriam protestar em frente ao Itaquerão e foram afastados pelas torcidas organizadas do Corinthians. Qualquer semelhança com paixão futebolística não é mera coincidência.
Mas a conta veio. O PT perdeu apoio de boa parte da esquerda e não soube dialogar com esse centro-direita jovem. Os puristas da esquerda arrebentaram Marina quando ela disse que a “nova política” não podia ser só de esquerda, ignorando que em uma democracia temos que conviver com conceitos mais abrangentes que a nossa própria visão ideológica. Confundiram programa de governo com o ambiente democrático. Hoje o PT corre o risco de sofrer uma grande queda se perder o governo federal. A verdadeira direita, em compensação, está mais forte que nunca. Ela sabe que esses manifestantes foram procurar integridade no fascismo, como tantas vezes já fomos obrigados a testemunhar. A direita aproveitou-se do que Benjamin chamava do “pessimismo desorganizado” da juventude para capitalizar votos. Conseguiu. Em contraponto a isso, o PT propõe um otimismo de Poliana que ninguém mais que não seja adepto quer subscrever. O mundo não está para otimismo e o PT não percebeu isso. Pode pagar caro, muito caro, por esse erro."
09/10/14: "O paradoxo é que hoje quem mantém boa parte do orçamento do fascismo na política é o próprio PT. Ao se aliar a partidos como o PP, o PT cede parte do orçamento público para que cargos em comissão ajudem a financiar campanhas e deem sustentação econômica para esses partidos (sem falar de outro tipo de financiamento). A razão disso é que o PT precisa deles para governar: o peemedebismo é o modus operandi típico do sistema político brasileiro e o partido ajudou a o consolidar. Quando o peemedebismo foi contestado, durante as manifestações, o PT resistiu a aceitar e preferiu se agarrar nos aliados, apostando que no final a chantagem (“nos atacar é fortalecer a direita”) seria suficiente para derrubar a revolta. Não foi. O resultado disso é que o PT perdeu o apoio de boa parte da esquerda e o lado direito do governismo se fortaleceu. Como naquele conto do escorpião, está pronto para dar o bote quando se tornar forte o suficiente para andar com as próprias pernas ou encontrar melhor aliança. E o erro de demonizar as manifestações continua a pleno vapor nas eleições."
27/10/14: "O peemedebismo se fortaleceu com a eleição. Os novos partidos – PROS e PSD – conseguiram eleger governadores, apesar da artificialidade da sua base. O PMDB lavou as mãos para quem seria eleito: fosse quem fosse, continuaria firme e forte no governo. Para dar um exemplo, o Governador Sartori, do PMDB gaúcho, apoiou Aécio enquanto Michel Temer era o vice da chapa de Dilma. O PSB também saiu por cima: conseguiu colocar governadores e foi competitivo onde perdeu, mostrou-se aberto a alianças por todos os lados, afastou a ameaça de ser sombra de Marina e da Rede e tornou-se a segunda força peemedebista, abaixo apenas do próprio PMDB, no Brasil. As fraturas causadas por Roberto Amaral e Luiza Erundina na realidade apenas fortalecem o partido, já que sabemos que o peemedebismo como prática prefere a fragmentação à unidade. O PV também fortaleceu-se nesse espectro com a figura simpática e ousada de Eduardo Jorge, afirmando o status paradoxal da sua política arrojada na plataforma e fisiológica nas práticas de modo tranquilo e explícito. Sobre o avanço dos reacionários, o Diego Viana já escreveu muito bem e tenho pouco a acrescentar. Talvez em outra oportunidade. Por ora, porém, fica a observação de que não creio impossível que Bolsonaro funde novo partido para alinhar as bases ultraconservadoras e firmar uma força política como o Front Nacional na França, ficando como espécie de Le Pen brasileiro. Como o PP é partido peemedebista e Bolsonaro recebeu parte da sua votação exatamente pela imagem de “integridade” que caracteriza os fascistas, essa ameaça é real e existe.
(...)
O outro derrotado nas eleições é o próprio PT, especialmente o projeto dilmista. Sim, venceu, e isso é sempre melhor que perder. Mas sabe que terá que encarar uma base hostil e que boa parte dos votos que foram decisivos – os de Ninguém – foram simples vetos a Aécio. A quantidade de manifestações que eram compartilhadas por militantes de figuras importantes que diziam votar em Dilma apesar de tudo mostra o esgotamento do projeto. Em determinado momento, nem mesmo a polarização com o PSDB foi suficiente para despertar o apoio. Somente com o risco real de o PSDB voltar ao poder que foi possível mobilizar o “voto crítico” a seu favor. De qualquer forma, mais quatro anos de governo nos mesmos termos do anterior tendem a tornar esse eleitorado – que se mostrou fiel da balança – ainda mais hostil. A reação do Governo Federal aos novos movimentos sociais nos próximos quatro anos vai ser um termômetro disso tudo."
24/12/2014: "Em síntese, como previsto por muitos, o Governo Dilma será ainda pior que o primeiro. Quatro longos anos em que veremos o PT sangrar gastando suas últimas reservas de credibilidade à esquerda para, no próximo pleito, lançar sua última cartada com o retorno de Lula. Será uma legítima agonia para todos nós."
26/02/15: "A política pediu a conta. Nos últimos 4 anos, não apenas Dilma consolidou o peemedebismo (i.e., a fisiologia parlamentar), como buscou fomentar a mentalidade do “não há alternativa” a isso. O pragmatismo rasteiro fortaleceu o PMDB e depois, achando que podia picar o próprio escorpião, fomentou o surgimento de outros partidos fisiológicos para enfraquecê-lo e governar desimpedido. Ao mesmo tempo, afastou-se das pautas da esquerda e perdeu sua base natural. Não conheço estratégia mais burra: perdeu-se os aliados naturais e o escorpião ficou ainda mais venenoso, porque conta como aliados com os próprios fisiológicos que supostamente iriam o enfrentar. A arrogância, mais uma vez e como sempre, deixa o Governo engasgado. Sempre ela.
Mais ainda: o PT fechou a torneira de todas as alternativas de esquerda. A desmobilização dos movimentos sociais não foi apenas obra do acaso ou do adesismo. Eles foram e estão sendo brutalmente reprimidos por meio de perseguição policial, indiciamento, julgamento e prisões. O Brasil vive um estado de exceção com prisões políticas continuamente acontecendo, mesmo que isso não signifique um tipo de conspiração de todos os poderes, mas apenas o funcionamento mais ou menos natural de uma máquina arbitrária que, formada na Ditadura Militar, acostumou-se a considerar a subversão ou a dissidência como assunto de polícia. Ao manter José Eduardo Cardozo na pasta da Justiça, Dilma sinaliza que não tem qualquer interesse de mudar essa política, consentindo inclusive com o aspecto genocida que caracteriza as operações militares (ela própria afirmou-as como modelo) que acontecem na Favela da Maré. Não há nenhum sinal de mudança a respeito."
07/08/15: "Dilma continua erraticamente usando exatamente a mesma estratégia que usou nos últimos anos, com destaque para as últimas eleições: pratica um jogo ambivalente em que toma medidas que agradam os setores mais poderosos da sociedade, buscando uma trégua, enquanto deixa seus pittbulls da mídia governista comandarem a militância usando a retórica do “nós” contra “eles”. Essa estratégia ficou clara quando vazou o memorando no qual os “blogs progressistas” são considerados carros-chefe da comunicação do Planalto. Evidentemente, está completamente equivocada, pois o lado beneficiado não se reconhece como tal na medida em que é atacado discursivamente como “o inimigo” e ao mesmo tempo tampouco tem qualquer simpatia pelo governo. Do outro lado, aqueles que o sustentam discursivamente se veem o tempo todo desmentidos pelos fatos, sem poder alegar a favor do seu discurso nada a não ser uma noção substancialista de identidade de esquerda que residiria na estrela petista. Quanto mais aumentam as concessões, mais forte fica o outro lado, que por sua vez sempre acha pouco o concedido e passa a atacar — agora, com a queda de popularidade — a fim de se colocar na cabeça do programa. Do outro lado, minguam as justificativas dos apoiadores, constantemente vendo-se constrangidos com escolhas como Kátia Abreu e Eliseu Padilha, e quanto mais defendem mais podem ter certeza de que o governo fará menos para ajudá-los a demonstrar seus argumentos. É incrível como algo que vem dando errado há tanto tempo – desde 2013, pelo menos — continua sendo repetido ad nauseam, sem que haja qualquer sinal de mudança de rumo. Não adianta dez milhões de pessoas dizerem que a estratégia está toda errada, ela vai se repetir até o fim. Passo a chamar, a partir de agora, de estratégia zumbi."
Está tudo em: http://moysespintoneto.wordpress.com
Fonte: Moysés Pinto Neto
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