abril 05, 2016

Ibama libera obras de manutenção da BR-319, mas exige que o Dnit recupere o dano ambiental. Por Elaíze Farias (AMAZÔNIA REAL)

PICICA: A matéria de Elaíze Farias deve entrar para os anais do registro do fim da Amazônia setentrional que conhecemos - destruição provocada pela construção de estradas que rasgam o sul do Amazonas.
04/04/2016 20:25
Políticos são contra um novo Estudo de Impacto Ambiental e convocam o Exército brasileiro para monitorar estrada. (Foto: Divulgação ALE/RO)

A presidente do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), Marilene Ramos, assinou na tarde desta segunda-feira (04) a concessão da licença de instalação das
04/04/2016 20:25
 
Políticos são contra um novo Estudo de Impacto Ambiental e convocam o Exército brasileiro para monitorar estrada. (Foto: Divulgação ALE/RO)

A presidente do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), Marilene Ramos, assinou na tarde desta segunda-feira (04) a concessão da licença de instalação das obras de manutenção e conservação no trecho de 405 quilômetros da rodovia federal BR-319, que liga as capitais Manaus (AM) e Porto Velho (RO), ao Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), autarquia do Ministério dos Transportes, mas determinou a recuperação dos danos ambientais na rodovia.

Em outubro de 2015, as obras de manutenção e conservação nesse trecho conhecido como “meião” foram embargadas pelo Ibama. As obras haviam sido licenciadas pelo Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), do governo do Amazonas, mas com a acusação de crime ambiental ao Dnit, a autorização foi suspensa pelo órgão ambiental federal.

A licença de instalação, a qual a Amazônia Real teve acesso, não autoriza a supressão vegetal (desmatamento) e nem intervenções em unidades de conservação, e apresenta uma série de condicionantes impostas ao Dnit em função dos danos ambientais. Entre elas está a instalação, em até 12 meses, de dois postos de monitoramento/segurança no início e no fim do trecho, de forma a se implementar/ampliar a fiscalização do local. O Dnit também deve efetivar medidas de controle de erosão para evitar carreamento de sedimentos para os cursos d’águas.

Segundo a licença do Ibama, o Dnit deve apresentar, em um prazo máximo de 45 dias, o plano de recuperação de áreas degradadas para os locais onde foram instalados ou substituídos bueiros, desvios de pontes e pontilhões, inclusive os executados quando da vigência da licença ambiental única, que foi expedida pelo Ipaam no dia 14 de agosto e que foi suspensa e depois não foi renovada.
A licença permite que as empreiteiras contratadas pelo Dnit façam obras de reconstrução de pontes de madeira, recuperação de bueiro e tapa-buracos de atoleiros. O valor atual das obras de manutenção/conservação é R$ 96 milhões, diz o Dnit. O Ibama diz que se as condicionantes forem descumpridas, a licença será suspensa ou cancelada.

Para autorizar o licenciamento das obras de manutenção, a Presidência do Ibama em Brasília pediu vistorias, análise e um parecer da Superintendência do Amazonas.

“O processo de manutenção para a trafegabilidade da rodovia federal BR-319 foi instruído e analisado pela superintendência e enviado para a Diretoria de Licenciamento em Brasília, que é quem recomenda à Presidente do Ibama a emitir o licenciamento ou não. O Ibama do Amazonas já concluiu a análise e não há nada contra a manutenção da estrada naquelas atividades previstas. Junto com a instrução, vão as condicionantes sobre os danos ambientais causados pelo Dnit”, declarou à Amazônia Real o superintendente do Ibama, Mário Reis.

O embargo e a suspensão das obras

Obra na rodovia não está respeitando as boas práticas, segundo Ibama. (Foto: Ibama)
Obra na rodovia não está respeitando as boas práticas, segundo o Ibama. (Foto: Ibama)

O trecho da BR-319 que passará por obras de manutenção e conservação do Dnit compreende o KM 250 e o KM 655,70 dos 870 quilômetros da rodovia. Ele é localizado nas áreas de florestas mais preservadas ao longo de toda a extensão da rodovia e está próximo de terras indígenas e unidades de conservação. Por isso, sua pavimentação é questionada por ambientalistas, cientistas e organizações da sociedade civil.

Os crimes ambientais identificados pelo Ibama cometidos entre os anos de 2014 e 2015, e que resultaram no embargo as obras após fiscalização realizada em agosto do ano passado, foram o aterramento e assoreamento de cursos d´água, despejo de resíduos sólidos irregular no solo e nos leitos dos igarapés, desmatamento ilegal e uso de minerais (cascalho) para as obras sem licenciamento.

O Ibama também identificou que os trabalhadores estavam em condições degradantes, sem acesso à água potável, alimentação e espaço adequado para dormir.

O órgão ambiental federal multou em R$ 7,5 milhões o Dnit, responsável pela contratação das empreiteiras. Segundo o Ibama, a multa está em processamento no órgão, submetida ao contraditório, como prevê a legislação.

O Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas entrou com uma ação pedindo a manutenção do embargo em 2015, acatada pela Justiça Federal do Amazonas. A liminar foi derrubada o embargo posteriormente no Tribunal Regional Federal. 

MPF enviou uma nova recomendação

A presidente do Ibama, Marilene Ramos na audiência do Senado. (Foto: Pedro França/AS)
A presidente do Ibama, Marilene Ramos na audiência do Senado. (Foto: Pedro França/AS)

 

No último dia 2 de março, o Ministério Público Federal do Amazonas enviou uma recomendação para que o Ibama não concedesse a licença para obras de manutenção antes de uma reunião marcada para acontecer no próximo dia 2 de maio, em Manaus, com a participação de todos os agentes institucionais federais e estaduais envolvidos nas discussões da BR-319. No entanto, Marilene Ramos não acatou. A recomendação foi assinada pelo procurador da República Rafael Rocha.

Na recomendação enviada ao Ibama pelo MPF, o procurador Rafael Rocha afirma que “a pretexto de realizar atividades de manutenção, conservação e recuperação da rodovia, o Dnit pretende, na verdade, restabelecer as suas condições de trafegabilidade entre Manaus e Porto Velho, sem uma avaliação adequada dos impactos ambientais e sociais, ou seja, sem demonstrar a viabilidade ambiental do empreendimento, mediante a apresentação de um EIA­/Rima ao Ibama”.

O procurador defende que o licenciamento ambiental seja único, inclusive para as obras de manutenção. “A legislação não permite o fracionamento do licenciamento ambiental. Portanto, o EIA/Rima deveria ser único e anterior ao início de qualquer atividade. A simples recuperação da trafegabilidade mínima da rodovia pode causar impactos graves e irreversíveis, que precisam ser identificados e avaliados pelo órgão ambiental competente”, disse o procurador à Amazônia Real. Rocha também afirmou que não se pode perder de vista a principal função do licenciamento, que é o estabelecimento de salvaguardas capazes de evitar, mitigar e compensar eventuais danos ambientais.

“A reunião na Procuradoria seria uma oportunidade para que o Ibama demonstrasse a legalidade da pretendida licença para atividades de manutenção. Ao mesmo tempo, com a participação de diversos órgãos responsáveis pelo fortalecimento da governança ambiental na área de influência da rodovia, podem surgir  compromissos e parcerias”, afirmou o procurador Rafael Rocha, que se reuniu com a Marilene Ramos na última sexta-feira (01), em Brasília, reforçando a recomendação.

Ao responder o questionamento da Amazônia Real sobre o fato do Ibama não ter acatado a recomendação, a assessoria do órgão informou o seguinte: “na reunião com o MPF na última sexta-feira, houve entendimento no sentido de houve entendimento no sentido de retificar a licença para inclusão de novas exigências/condicionantes, caso a reunião do dia 02/05 aponte essa necessidade”.

Políticos convocam o Exército brasileiro

O general de brigada Costa Neves, Comandante da 17ª BIS,, falou na audiência no Senado. (Foto: Pedro França/AS)
O general de brigada Costa Neves, Comandante da 17ª BIS,, falou na audiência no Senado. (Foto: Pedro França/AS)

Com uma extensão de 870 quilômetros, partindo de Manaus até Porto Velho (RO), a BR-319 é alvo de um forte lobby de políticos das bancadas do Amazonas e Rondônia no Congresso e do setor empresarial para que o governo da presidente Dilma Rousseff autorize o licenciamento ambiental para o asfaltamento da rodovia sem a necessidade de um novo Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima), obrigatório para este tipo de empreendimento. Os dois Estudos apresentados pelo Dnit foram reprovados pelo Ibama e um novo processo está parado desde 2014.

Atualmente, o acesso à estrada é permitido, sendo utilizado, inclusive, por companhia de transporte coletivo, mas o trecho do “meião” está intransitável pela falta de manutenção e as chuvas do período.

Um dos políticos que integram o lobby pelo asfaltamento da BR-319 é o senador Acir Gurgacz (PDT-RO), que é sócio minoritário da maior empresa do transporte rodoviário entre os Estados do Amazonas e Rondônia, a Eucatur (Empresa União Cascavel de Transportes e Turismo Ltda). A Eucatur também tem uma frota de ônibus operando no sistema de transporte público em Manaus.

Em 2015, o senador Gurgacz foi relator na Comissão Mista do Orçamento do Congresso Nacional das contas do governo Dilma Rousseff de 2014. Seu parecer favorável, dado no dia 22 de dezembro de 2015, contrariou parecer do TCU (Tribunal de Contas da União), que havia recomendado rejeição às contas por causa das chamadas “pedaladas fiscais” (saiba mais).

Gurgacz integra um grupo de parlamentares que convocou uma audiência pública realizada na última quinta-feira (30) no Senado, e que contou com a presença do general de brigada Ricardo Augusto Ferreira Costa Neves, Comandante da 17ª Brigada de Infantaria de Selva, de Marilene Ramos, presidente do Ibama, e de Valter Casimiro Silveira, diretor-geral do Dnit. Na ocasião, a presidente do Ibama anunciou que a licença para as obras de manutenção sairia em breve.

Procurado pela Amazônia Real, o senador Acir Gurgacz respondeu, por meio de sua assessoria, que considera “importante” o EIA/Rima, mas que ele seja feito a partir dos estudos já realizados (justamente os reprovados pelo Ibama). “Já foram aplicados mais de R$ 100 milhões em estudos ambientais e na criação de unidades de conservação. Queremos que a reabertura da rodovia seja um instrumento de proteção da floresta e de desenvolvimento sustentável da região”, disse.

Sobre o retorno das obras na rodovia, Gurgacz afirmou que espera que a manutenção seja “permanente” e que seja possível “viabilizar a reconstrução e pavimentação completa do meião, para que essa rodovia cumpra sua função de integração da Amazônia e contribua para o desenvolvimento regional”.

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) também defende a agilização do licenciamento da pavimentação, mas disse que é favorável ao EIA/Rima. “É evidente que também defendemos a preservação da Amazônia, aliás a maior riqueza que o nosso País tem. Agora não podemos condenar essa região ao isolamento. O direito de ir e vir é de todos, e estamos lutando por isso, e com muita responsabilidade”, afirmou.

Grazziotin disse à Amazônia Real que, por meio da Comissão de Infraestrutura do Senado, será realizado em breve um seminário em Manaus para discutir a proposta de construção de uma estrada-parque “no sentido de preservar e valorizar o meio ambiente ao longo da rodovia”. Com isso, segundo a senadora, espera-se avançar ainda para que o licenciamento seja feito o mais breve possível.

Vanessa Grazziotinn e Acir Gurgacz integraram uma comitiva de políticos que percorreu em outubro de 2015 toda a extensão da BR-319 para chamar atenção para a necessidade de retomada da obra. Os senadores declararam que não constataram danos ambientais ao longo do trecho do meio, discordando do que disse o Ibama (leia aqui).

Durante a audiência do último dia 30, o general de brigada Ricardo Augusto Ferreira Costa Neves, Comandante da 17ª Brigada de Infantaria de Selva, destacou que “a importância estratégia de Manaus para o nosso Brasil e para a Pan Amazônia é grande”.

“Agora está em estudo pelo Exército Brasileiro a criação dos Batalhões de Engenharia de Selva. Essas unidades poderão estar dispostas nas atividades do Exército, no terreno, para garantir que todas as demandas ambientais sejam atendidas e o impacto ambiental seja mitigado da forma adequada”, afirmou.

Acir Gurgacz elogiou a participação do Exército no processo de reabertura da BR-319.  “É importante para a segurança nacional, para a proteção da floresta e para que tenhamos duas bases avançadas, uma em cada ponta do meião, para que todos os órgãos possam trabalhar de forma integrada (PRF, PF, Ibama, Ipaam, ICMBio, etc). Creio que o Exército também pode auxiliar com seu departamento de engenharia na reconstrução da rodovia”, disse à Amazônia Real.

As tratativas sobre participação dos militares nas obras da BR-319 já chegaram, inclusive, ao comandante do Exército, general Eduardo Villas-Boas. A senadora Vanessa Grazziotin afirmou que em novembro do passado tratou do assunto diretamente com o general. “Ele prontamente disse que estava preparado para ajudar na instalação de um Batalhão na região do Careiro para ajudar não só na fiscalização como também na manutenção da obra. É bom lembrar que o Exército é parceiro do Dnit em diversas obras pelo país, inclusive a BR-319. O Exército tem pronto o projeto para instalar o batalhão. Nos comprometemos a elaborar emendas ao Orçamento para essa finalidade”, disse.

Foi durante a audiência do dia 30 de março que Marilene Ramos anunciou aos senadores que a licença para as obras de manutenção da BR-319 estaria prestes a sair. Ela chegou a dar como prazo o último dia 01.

“Ontem (29) a tarde, quando cheguei a Brasília, soube que o processo estava completo e que a licença sairá nos próximos dias. Não temos (a licença) hoje (30) porque ontem o processo ficou completo, mas a garantia é que até sexta-feira (01º) a gente tenha a licença dentro daqueles parâmetros que foram acertados”, afirmou.

Estes parâmetros mencionados pela presidente do Ibama na audiência, conforme esclareceu a assessoria de imprensa, em resposta à Amazônia Real, são referentes “às obras de manutenção ao que estava previsto em TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) desde 2008, para impedir que se repitam os impactos ambientais que resultaram no embargo da obra pelo Ibama”.

Marilene Ramos esteve em Manaus na última terça-feira (29). Na sua agenda, ela visitou o Ibama e teve audiência com o governador José Melo (Pros), que no início deste ano propôs que processo de licenciamento ambiental da pavimentação passasse para a esfera estadual. Era intenção de José Melo acabar com o impasse transferindo tudo (licença de manutenção e de pavimentação) para o governo do Amazonas, mas a proposta não foi aceita pelo Ibama.

Questionada sobre as atuações dos parlamentares, o Ibama negou à Amazônia Real que Marilene esteja sofrendo pressão dos políticos do Amazonas e de Rondônia para autorizar o licenciamento da estrada, já que o lobby parte também de aliados da presidente Dilma, como a senadora Vanessa Grazziotin, uma das defensoras contra o processo de impeachment no Congresso.

Sobre a visita de Marilene Ramos a Manaus, a assessoria de imprensa do Ibama disse a presidente do órgão está viajado regularmente aos Estados, priorizando a região amazônica, para orientar superintendentes e reunir-se com servidores, além de representantes dos órgãos estaduais de meio ambiente, para que haja melhor integração dos trabalhos. “A visita ao o governador José Melo foi em atendimento ao convite dele”, diz a nota.

Funcionários revelam pressão política

Políticos do Amazonas e de Rondônia durante caranava na BR 319, em 2015. (Foto: ALE/RO)
Políticos do Amazonas e de Rondônia durante caravana na BR-319, em 2015. (Foto: ALE/RO)

A reportagem apurou que, frente à interferência política e pressão de interesses econômicos, atritos administrativos ocorreram internamente no Ibama, em Brasília, desde outubro de 2015, com posicionamentos contrários e favoráveis à maneira como o processo de licenciamento das obras estavam sendo conduzidas. Funcionários disseram à reportagem estarem sofrendo pressão e ameaças, sendo obrigados a obedecer a hierarquia.

Amazônia Real também apurou que o Ibama acabou admitindo, ao final, que a retomada das obras de manutenção para a trafegabilidade da BR-319 seria inevitável. Por isso, reconheceu que ao manter o controle das obras “evitaria o pior”. Ou seja, a competência do licenciamento permitirá ao Ibama acompanhar as obras regularmente para fiscalizar se estão ou não ocorrendo irregularidades, apesar dos recursos escassos para fazer vistorias, operações e fiscalização.

O Ibama planeja monitorar de maneira permanente as obras, especialmente na área onde há unidades de conservação, entre elas a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Igapó Açu, a RDS Amapá, o Parque Nacional Nascente do Lago Jari e a Reserva Extrativista Capanã Grande.

“Para fazer o monitoramento da obra, como ocorreu no caso do embargo, o Ibama utilizará todos os recursos aéreos e terrestres, além dos satélites disponíveis”, disse a assessoria do Ibama à Amazônia Real, quando indagada sobre como o órgão está aparelhado para realizar o monitoramento.

Dnit não entregou EIA/Rima

Igarapé obstruído durante as obras. (Foto: Ibama)
Igarapé obstruído durante as obras. (Foto: Ibama)

O retorno das obras de manutenção/conservação não autoriza a pavimentação, nem a construção de pontes de concreto na BR-319. Para essa etapa, o Dnit precisa apresentar o Estudo de Impacto Ambiental (Eia/Rima). A Amazônia Real já perguntou diversas vezes como está o processo de elaboração do EIA/Rima da BR-319 à assessoria do Dnit, mas até o momento órgão não respondeu.
O primeiro EIA/Rima foi apresentado em 2008, mas o Ibama reprovou ao identificar falhas e solicitou um novo estudo. O componente de fauna, por exemplo, apresentava apenas dados secundários. Também não havia informações com profundidade do local afetado e não foram contemplados os aspectos de ciclo hidrológico de cheia e vazante dos rios e igarapés que cortam a área do meião. Outra exigência foi a inclusão do componente indígena, cujo estudo precisa ser autorizado pela Funai.

Sobre o processo do EIA/Rima, a assessoria de imprensa do Ibama disse que o órgão emitiu em outubro de 2014 um Termo de Referência (TR) para um novo estudo, que até agora não foi protocolado no Instituto. “O prazo para apresentação do EIA/Rima é dado pelo interesse do empreendedor. A Instrução Normativa 184/2008 prevê validade de dois anos para o TR​, que deverá ser revalidado se este período for ultrapassado”, disse nota da assessoria.

Amazônia Real enviou na semana passada à assessoria de imprensa do Dnit perguntas sobre o cronograma da retomada das obras após ao anúncio feito pela presidente do Ibama durante a audiência do Senado de que o licenciamento sairá, mas ainda não obteve respostas. Em e-mail anterior, a reportagem perguntou do Dnit sobre as próximas ações do órgão referentes à BR-319. Na resposta, a assessoria de imprensa informou que o órgão “retomará os contratos de manutenção, assim que equalizadas as questões ambientais e já há estudos em andamento para execução dos demais tipos de serviços no trecho”.

A assessoria disse também que as empresas atualmente contratadas e que já atuavam são a Tescon Engenharia LTDA e Meireles Mascarenhas LTDA, e que o valor total do investimento na manutenção é de R$ 96 milhões. “Até o momento foram aferidos em serviços realizados o total de R$ 50,6 milhões, o que representa em torno de 52% executado”. Na ocasião, ao ser indagado se o Dnit estava realizando tratativas oficiais com o Exército, a assessoria informou que isto não existia.

Na audiência no Senado, o diretor-geral do Dnit, Valter Casimiro Silveira, destacou a necessidade de um novo projeto de EIA/Rima e declarou que o órgão trabalha para definir se, para proteger o meião, será construída uma estrada-parque, se será instalado um alambrado ou a colocação de bloquetes (blocos pré-moldados de concreto). Esta terceira é considerada por ele como “inviável”.

“Estamos tendo conversa com o Banco Mundial para um projeto mais sustentável para ser aceito pelo órgão ambiental e pelo MPF. E que tenha viabilidade para trafegabilidade.  Vamos fazer isso (controle de peso) na 319 para diminuir o desgaste no período de grande precipitação (chuva). O Dnit está preocupado com a infraestrutura, mas também com o meio ambiente”, afirmou Silveira.

Ele salientou que uma das dificuldades do EIA/Rima tem sido o Componente Indígena. “O Dnit precisa fazer estudos indígenas. Temos (que fazer isso) infelizmente para cumprir os requisitos legais. Tem que ficar paralisado até que a gente consiga a liberação. Isso ocorre em diversas rodovias no país. A gente tem que aguardar o trâmite com a Funai”, disse o diretor-geral do Dnit.

Ambientalistas e cientistas já alertaram inúmeras vezes que, sem um Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) rigoroso, que incluem compensações, mitigações e ações de proteção ao longo do trecho do meio, além de uma forte fiscalização de todos os órgãos, incluindo a Polícia Rodoviária Federal, o avanço do desmatamento, das queimadas, da especulação fundiária e da grilagem de terras se intensificarão.

As irregularidades ambientais cometidas pelo Dnit identificadas em agosto de 2015, durante fiscalização da superintendência do Ibama, foram um estopim para a confirmação de que sem fiscalização adequado a estrada servirá para o aumento da exploração madeireira ilegal, migração desordenada. No ano passado, o Ibama flagrou o aumento das queimadas no entorno da estrada.
Em entrevista dada à Amazônia Real, senadora Vanessa Grazziotin fez uma retrospectiva dos estudos apresentados desde 2009 questionou as desaprovações feitas pelo Ibama dos estudos de impacto ambiental feitos pelo Dnit. “Todos os problemas alegados pelo órgão ambiental foram sanados nos novos estudos, áreas de preservação foram criadas ao longo da estrada, mas o impasse para recapear persiste. Definitivamente precisamos avançar”, disse.

Rodovia vira embate institucional

Os ônibus da empresa Aruanã na BR 319 (Foto de reprodução do Facebook autorizada por Markilze Pereira)
Os ônibus da empresa Aruanã na BR-319 (Foto de reprodução do Facebook autorizada por Markilze Pereira)

O complexo impasse envolvendo as obras de manutenção da BR-319 incluem uma queda de braço entre o Ibama, o Dnit, o governo do Amazonas, parlamentares e o Ministério Público Federal (MPF).

O governador do Amazonas, José Melo (Pros), assumiu o caso pessoalmente e propôs que processo de licenciamento ambiental da pavimentação passasse para a esfera estadual. Era intenção de José Melo acabar com o impasse transferindo tudo (licença de manutenção e de pavimentação) para o governo do Amazonas.

A proposta não foi aceita pela presidente do Ibama, Marilene Ramos, que determinou que os estudos visando o licenciamento para as obras de manutenção passassem para a competência  da superintendência do órgão no Amazonas.

Antes disso, na tentativa de solucionar o impasse de competência, o Ibama elaborou um Termo Aditivo a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). O Aditivo estabelecia regras não previstas no TAC. Uma delas proibia qualquer intervenção no trecho central da rodovia antes da elaboração do EIA/Rima, mas previa que o licenciamento para a manutenção fosse delegado ao órgão ambiental do Estado do Amazonas.

Mas o MPF entrou com uma ação civil pública para derrubar todos os termos encontrados no Aditivo. Paralelamente, o procurador Rafael Rocha, autor da ação, enviou ao Ipaam uma recomendação para que o órgão se abstivesse (na prática, não aceitasse) de licenciar as obras de manutenção do trecho do meião. O Ipaam decidiu acatar a recomendação.

Para o procurador da República Rafael Rocha, este Termo Aditivo não era válido, pois delegava a competência de realizar o licenciamento ambiental ao Ipaam, sem a concordância do mesmo. Segundo Rocha, o Ipaam poderia licenciar sem os cuidados ambientais necessários. Este foi um dos motivos de ele defender a competência exclusiva do Ibama para licenciar todas as obras na BR-319.

A Amazônia Real também indagou o procurador sobre o que ele acha da demora do Dnit em apresentar o Eia/Rima que permitiria o licenciamento para a pavimentação. Segundo Rafael Rocha, se o Dnit aceitasse elaborar um estudo “em estrita conformidade com as orientações do Ibama, impasse que dura há pelo menos dez anos, a rodovia já estaria inclusive pavimentada”.

População de Humaitá, no Amazonas, em manifestação a favor da BR 319. (Foto: ALE/RO)
População de Humaitá, no Amazonas, em manifestação a favor da BR 319. (Foto: ALE/RO)

Fonte: AMAZÔNIA REAL

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