PICICA: "Em 1961, Chico Buarque já publicava crônicas no jornal de sua escola.
Sua primeira aparição na imprensa, no entanto, naquele mesmo ano,
deveu-se a outro tipo de arte: o “menor” “F. B. H.” e um amigo
estrelaram matéria do jornal Última Hora sobre dois “pivetes” presos
pela polícia. Chico narra a história no documentário abaixo (14min45s –
17min20s):
Os dois “jovens transviados” furtavam
carros para dar seus rolezinhos por São Paulo. Rodavam até acabar a
gasolina, então abandonavam o veículo pela cidade. Até que, uma noite,
foram pegos. Apanharam bastante da polícia, “apesar da cara da gente”,
diz Chico – cara de adolescentes da elite paulistana e socialmente
reconhecidos como brancos, subentende-se. Ao final, Chico foi punido
com a proibição de sair de casa à noite desacompanhado de responsáveis
até completar 18 anos de idade (faltavam cerca de seis meses)."
F. B. H., de “menor infrator” a Chico Buarque
Em comemoração aos 25 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente
Em 1961, Chico Buarque já publicava crônicas no jornal de sua escola.
Sua primeira aparição na imprensa, no entanto, naquele mesmo ano,
deveu-se a outro tipo de arte: o “menor” “F. B. H.” e um amigo
estrelaram matéria do jornal Última Hora sobre dois “pivetes” presos
pela polícia. Chico narra a história no documentário abaixo (14min45s –
17min20s):
Os dois “jovens transviados” furtavam
carros para dar seus rolezinhos por São Paulo. Rodavam até acabar a
gasolina, então abandonavam o veículo pela cidade. Até que, uma noite,
foram pegos. Apanharam bastante da polícia, “apesar da cara da gente”,
diz Chico – cara de adolescentes da elite paulistana e socialmente
reconhecidos como brancos, subentende-se. Ao final, Chico foi punido
com a proibição de sair de casa à noite desacompanhado de responsáveis
até completar 18 anos de idade (faltavam cerca de seis meses).
O juiz – e talvez até, antes dele, o
delegado – certamente levou em conta a natureza do ato, que pode ter
sido corretamente enquadrado como “furto de uso” e, em consequência,
desqualificado como crime, por não se configurar a vontade de tomar a
coisa para si com ânimo definitivo, necessária à configuração do tipo
penal de furto. Além disso, deve ter considerado fundamental que “F. B.
H.” era um adolescente que não merecia mofar em uma cadeia ou
instituição de internamento de “menores” devido a uma brincadeira de mau
gosto. Haveria outras formas, mais justas e eficazes, de educá-lo para
não repetir aquela conduta.
Que ótimo que foi esse o desfecho do caso
– lamentável e inadmissível, óbvio, a violência da polícia. Menos de
dois anos depois, em 1963, Chico iniciou o curso de Arquitetura na USP;
em 1964, vieram os primeiros shows e a primeira canção gravada – a
carreira explodiria no Festival de 1966. Já pensou se a vida daquele
jovem tivesse sido interrompida, naquele momento decisivo, por um
período de encarceramento? Será que ele teria conseguido as mesmas ou
outras oportunidades para se realizar profissionalmente em sua vocação
de artista?
Acontece que não só a família de Chico,
mas o Estado e a sociedade brasileira tinham um projeto para ele, assim
como para cada jovem das nossas classes privilegiadas. O país está
montado para esses jovens “darem certo”. Quando cometem “deslizes”,
“erros”, “desvios”, têm direito a novas oportunidades.
E se Chico Buarque não fosse filho de um
eminente intelectual e professor da USP? Se não integrasse aquela
pequena classe de brasileiros/as que gozamos do direito à cidadania
efetiva? Se fosse um desses jovens pretos e pobres da periferia tratados como criminosos por darem rolezinhos em Shoppings, hoje em dia, sem cometerem qualquer tipo de crime ou contravenção?
Para estes, as vítimas tratadas como “classes perigosas”, o Brasil tem outro projeto: “E o que eles querem: mais um ‘pretinho’ na Febem”, cantam
os Racionais Mc’s. Pra eles, não tem nem segunda nem primeira
oportunidade, não tem aposta na educação; tem prisão, internação,
repressão. Justiça como restauração? Vingança e escravidão.
Enquanto isso, a Pátria Educadora, distraída pela ameaça da redução da maioridade penal, foi subtraída ontem em mais uma tenebrosa transação. O Senado aprovou Projeto de José Serra, com apoio do governo Dilma,
que desfigura o Estatuto da Criança e do Adolescente, aumentando de
três para dez anos o tempo máximo de medidas socioeducativas de
internação.
PS: faz alguns meses, usaram o episódio
“juventude transviada” de Chico Buarque para alegar que ele é contra a
redução da maioridade penal porque seria um “bandido” desde a
adolescência (!). A boçalidade não tem limites e convida sempre à
perseguição, jamais à reflexão.
Fonte: Brasil em 5
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